De que forma as alterações climáticas afetam a saúde humana?
É consensual que a saúde da população é influenciada por uma multiplicidade de fatores. De entre os principais fatores surgem os fatores ambientais, com principal destaque para as alterações climáticas. As Nações Unidas estimam que, atualmente, 1 em cada 4 mortes no mundo está relacionada com riscos ambientais.
Maria Neira, Diretora do Departamento de Saúde Pública, Ambiente e Determinantes Sociais da Saúde da Organização Mundial da Saúde salienta que “nunca ficou tão claro que a crise climática é uma das emergências de saúde mais urgentes que todos enfrentamos”.
As alterações climáticas afetam a saúde humana ao alterar a gravidade e frequência de problemas existentes já afetados por fatores climáticos ou meteorológicos e criam desafios imprevistos.
Os impactos climáticos manifestam-se de diversas formas e têm uma repercussão significativa na população, prejudicando a sua saúde física e mental. Segundo as Nações Unidas, a cada ano, os fatores ambientais tiram a vida de cerca de 13 milhões de pessoas. A mudança dos padrões climáticos está a expandir o número de doenças e os eventos climáticos extremos aumentam as mortes e dificultam a manutenção dos sistemas de saúde.
A concentração dos gases de estufa aumenta, resultante de atividades humanas como a queima de combustíveis fósseis e a desflorestação, provocando a subida das temperaturas globais, amplificando os eventos de calor extremo, o que resulta em ondas de calor mais frequentes e fortes, intensificando a probabilidade de insolação e exaustão por calor, além de agravar condições médicas pré-existentes.
Em 2023 registaram-se temperaturas globais excecionalmente elevadas, como pode ler-se no relatório Global Climate Highlights de 2023, lançado pelo Programa Copernicus.
Este relatório demonstra que 2023 foi o mais quente alguma vez registado, com a temperatura global próxima do limite de 1,5°C, ultrapassando 2016. E, ainda, que cada mês desde junho a dezembro de 2023 foi mais quente do que o mês correspondente em qualquer ano anterior.
Os impactos climáticos resultam ainda em eventos climáticos extremos, tais como furacões, tsunamis, tempestades intensas, inundações e secas prolongadas, que se tornam cada vez mais frequentes e intensos, estando os mesmos entre as razões do crescimento global da fome e da subnutrição.
Para além disso, as alterações climáticas podem alterar as áreas de distribuição geográfica de insetos vetores, como mosquitos, o que pode levar ao aumento de doenças transmitidas por vetores como malária, dengue, zika e febre do Nilo Ocidental. E, ainda, ao crescimento de ambientes propícios para a proliferação de doenças infeciosas, como doenças transmitidas pela água.
Entre os impactos negativos das alterações climáticas encontramos ainda a degradação da qualidade do ar, que é já considerada a 4ª causa de mortalidade global a nível mundial, agravando problemas respiratórios existentes e contribuindo para o desenvolvimento de doenças pulmonares e cardiovasculares. De notar que, por ano, segundo a OMS, morrem 12,6 milhões de pessoas, 24% de todas as mortes no mundo, devido a causas ambientais. Quase metade dos óbitos devido a causas ambientais deve-se à poluição atmosférica.
Para além de impactar à saúde física, as alterações climáticas provocam sequelas na saúde mental. Eventos climáticos extremos podem causar traumas e stress. A preocupação com as mudanças climáticas e os seus efeitos futuros pode contribuir para a ansiedade e a depressão, consequência direta da crescente consciencialização sobre a crise climática e do seu impacto nas nossas vidas.
Mas afinal quem está em risco?
Todos enfrentamos o risco de impactos na saúde associados às alterações climáticas. No entanto, algumas pessoas enfrentam riscos mais elevados do que outras devido às diferenças nos perigos a que estão expostas, à sua sensibilidade a esses perigos e à sua capacidade de adaptação.
Salienta-se ainda o facto de que os diferentes impactos na saúde não ocorrem isoladamente, uma vez que as pessoas podem enfrentar múltiplas ameaças ao mesmo tempo.
O relatório do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) afirma que cerca de 3,5 bilhões de pessoas, quase metade da humanidade, vivem em áreas altamente vulneráveis às alterações climáticas.
A exposição aos perigos está relacionada com o contacto entre uma pessoa e um ou mais fatores de stress, consequentes das alterações climáticas. Neste sentido são mais vulneráveis as populações pobres ou de baixos rendimentos, uma vez que podem estar mais expostas a ameaças por fatores socioeconómicos, por exemplo, sem recursos para ter climatização em casa, sendo mais propensas a ser expostas ao calor extremo. Mas, também, grupos ocupacionais, pessoas que trabalham ao ar livre, que estão expostas com mais frequência ou maior intensidade, por exemplo, ao calor ou aos insetos. E, ainda, residentes em certos locais, nomeadamente, pessoas que vivem em sítios mais propensos a seca, cheias, inundações ou tempestades, como as que vivem ao largo da costa, que estão mais expostas à subida do nível do mar.
No que diz respeito à sensibilidade aos perigos, falamos do grau que as pessoas ou as comunidades são afetadas, de forma adversa ou benéfica, pela sua exposição à variabilidade e às alterações climáticas. As mulheres grávidas têm riscos de saúde acrescidos, como o calor extremo ou certas doenças infeciosas, para além da sua própria saúde, física e mental, poder afetar a do bebé. As crianças são mais sensíveis a doenças respiratórias do que os adultos, devido ao baixo peso corporal, altos níveis de atividade física e pulmões ainda em fase de desenvolvimento. As pessoas com condições pré-existentes de saúde, como asma, são particularmente sensíveis à qualidade do ar, e pessoas diabéticas ou com outras doenças crónicas têm mais dificuldade em regular a temperatura corporal, sendo mais sensíveis ao calor extremo.
Em termos de adaptabilidade, que diz respeito à capacidade dos indivíduos ou comunidades se ajustarem às alterações climáticas, de aproveitarem as suas oportunidades ou de responderem às suas consequências, enquadram-se as pessoas idosas, pessoas com deficiência e pessoas nativas.
As populações idosas para além de serem fisiologicamente mais sensíveis, podem ter capacidade limitada, por exemplo, de se protegerem durante uma onda de calor. As pessoas com deficiência enfrentam maiores desafios na preparação ou resposta a eventos climáticos extremos. Por exemplo, as instruções de emergência ou de evacuação são muitas vezes inacessíveis a pessoas com incapacidades visuais, auditivas ou cognitivas. Já as pessoas nativas, cuja subsistência depende de alimento produzido localmente, são impactadas pelas mudanças que afectam a segurança, a disponibilidade e o valor nutricional de alguns alimentos e plantas medicinais.
Assim, percebendo que as alterações climáticas continuarão a afetar o risco à saúde, é necessário caminhar rumo à melhor compreensão e adaptação à mudança climática, e, também, trabalhar no combate e na mitigação de práticas que alavancam os eventos climáticos extremos, e fortalecer os sistemas de saúde das comunidades.
Links:
- Agência Europeia do Ambiente – https://www.eea.europa.eu/publications/harm-to-human-health-from-air-pollution
- Agência Europeia do Ambiente – https://www.eea.europa.eu/publications/air-quality-in-europe-2022/air-quality-in-europe-2022
- Agência Europeia do Ambiente – https://www.eea.europa.eu/publications/air-quality-in-europe-2022/health-impacts-of-air-pollution
- Agência Europeia do Ambiente – https://www.eea.europa.eu/publications/harm-to-human-health-from-air-pollution
- Agência Europeia do Ambiente – https://www.eea.europa.eu/pt/highlights/as-mortes-prematuras-devido-a
- Agência Europeia do Ambiente – https://www.eea.europa.eu/publications/air-quality-in-europe-2022/air-quality-in-europe-2022
- Agência Europeia do Ambiente – https://www.eea.europa.eu/publications/air-quality-in-europe-2022/health-impacts-of-air-pollution
- Copernicus – https://climate.copernicus.eu/global-climate-highlights-2023
- Comissão Europeia – https://ec.europa.eu/commission/presscorner/detail/en/IP_23_5951
- Comissão Europeia – https://climate.ec.europa.eu/climate-change/consequences-climate-change_pt
- Essência do Ambiente – https://essenciadoambiente.pt/combate-alteracoes-climaticas-combate-desinformacao/)
- Essência do Ambiente – https://essenciadoambiente.pt/a-poluicao-e-o-cancro-da-mama-ligacoes-perigosas/
- Essência do Ambiente – https://essenciadoambiente.pt/oms-impacto-ambiental-em-destaque-dia-mundial-saude/
- Essência do Ambiente – https://essenciadoambiente.pt/revive-impacto-ambiente-saude-populacao/
- Essência do Ambiente – https://essenciadoambiente.pt/18-milhoes-criancas-expostas-residuos-eletronicos/
- Expresso – https://multimedia.expresso.pt/059_cheias_fenomenos_extremos/
- Nações Unidas – https://news.un.org/pt/story/2023/12/1825322
- Nações Unidas – https://news.un.org/pt/story/2023/11/1822877
- Nações Unidas – https://news.un.org/pt/story/2023/11/1823697
- Nações Unidas – https://news.un.org/pt/story/2022/02/1781142
- RTP – https://ensina.rtp.pt/explicador/alteracoes-climaticas/
- Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) – https://www.ipcc.ch/report/ar6/syr/
- Portal Europeu da Juventude – https://youth.europa.eu/get-involved/sustainable-development/what-climate-change_pt
- SIC – https://sicnoticias.pt/mundo/2024-01-09-2023-e-o-ano-mais-quente-de-sempre-com-temperatura-global-proxima-do-limite-de-15C-1e192515
- Sábado – https://vidasustentavel.sabado.pt/alteracoes-climaticas/alteracoes-climaticas-em-que-medida-afetam-a-nossa-saude/